Quantas mulheres ainda serão as primeiras em posições de Poder?

Por Adriana Vasconcelos
Quantas mulheres ainda serão as primeiras em posições de Poder?

Só em 1827 as primeiras meninas foram autorizadas a ingressar nos colégios para cursar as escolas primárias no Brasil. Para que essas estudantes tivessem acesso às universidades demorou mais 52 anos. O direito ao voto só veio meio século depois. E apenas após a promulgação da Constituição de 1988, as mulheres passaram a ter os mesmos deveres e direitos que os homens no país.

Ao longo dessa trajetória, temos acompanhado a chegada paulatina de mulheres a espaços de Poder. Mais do que entrarem para a história, é preciso reconhecer o legado deixado por elas a cada estreia, abrindo avenidas para mudanças ainda mais profundas em uma sociedade que não estava acostumada com a presença feminina em postos de comando.

Foi preciso, por exemplo, que uma mulher chegasse à presidência do Superior Tribunal Militar, para que o país inteiro ouvisse o primeiro pedido de perdão público "pelos equívocos judiciários cometidos pela Justiça Militar Federal em detrimento da democracia e favoráveis ao regime autoritário". Um ato de coragem que incomodou colegas homens.

A posse da ministra Ellen Gracie no Supremo Tribunal Federal em 2000, a primeira mulher a ocupar uma vaga na Corte Suprema, não só quebrou um paradigma, como iniciou a pavimentação da estrada que, 18 anos mais tarde, garantiria uma das vitórias mais emblemáticas da luta feminina na política.

Isso ocorreu graças a uma ação coordenada de três mulheres que ocupavam simultaneamente cargos estratégicos: Carmem Lúcia na presidência da Suprema Corte, Rosa Weber no comando do Tribunal Superior Eleitoral e Raquel Dodge à frente da Procuradoria-Geral da República—a última pioneira no cargo que ocupava. O trio teve papel crucial na efetivação pelo Judiciário da regra que obriga os partidos a destinarem um mínimo de 30% dos recursos do Fundo Eleitoral para candidaturas femininas.

O resultado prático e imediato foi o aumento de cerca de 51% no número de deputadas federais eleitas, que subiu de 51 em 2014 para 77 em 2018. O que fez a representação feminina passar de 10% para 15% do total de cadeiras. Mas as recorrentes anistias concedidas pelo Congresso Nacional aos partidos políticos, que insistem em burlar a determinação da Justiça, acabaram reduzindo o ritmo desse crescimento em 2022. Hoje, a bancada feminina na Câmara dos Deputados conta com 91 parlamentares.

Mesmo ocupando apenas 18% das cadeiras do Parlamento, essas mulheres são responsáveis por 48% de toda a produção legislativa. Para chegar a esse patamar, elas tiveram de inovar em um ambiente super polarizado e radicalizado. Optaram por focar nas pautas em comum e não em suas diferenças ideológicas. E a atuação suprapartidária vem rendendo frutos sobretudo no combate à violência contra as mulheres.

É difícil saber quantas mulheres ainda serão as primeiras a ocupar posições de Poder, seja na esfera pública ou privada. O certo mesmo é que a cada porta aberta por elas, uma nova realidade se desenha à nossa frente—nos tribunais, no Congresso, nas empresas, em todos os lugares onde o talento feminino antes estava invisibilizado.

Os números não mentem: o lucro cresce, a corrupção diminui e a produção legislativa melhora quando mais mulheres estão no comando. A pergunta não é mais se elas devem estar lá. A pergunta agora é: por quanto tempo ainda vamos desperdiçar todo esse potencial?