Um pedido de desculpas nem sempre basta
por Adriana Vasconcelos
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Errar é humano! Mas nem sempre um pedido de desculpas é suficiente. Porque a sensação de impunidade acaba sendo um estímulo para a perpetuação de comportamentos abusivos e criminosos.
Especialmente, quando se trata de violência contra mulheres. Uma realidade escancarada diariamente a nossa frente, mas ainda minimizada, até inconscientemente, por muitos.
Reflexo da herança cultural de uma sociedade patriarcal e machista, que resiste contrariada aos muitos avanços já conquistados, graças a rebeldia de um grupo cada vez maior de mulheres que não se contentam com nada menos do que a igualdade de direitos e tratamento.
Claro que eu preferiria aproveitar esse espaço para focar em temas mais positivos, mas simplesmente não dá para ignorar os desdobramentos de alguns fatos recentes, contemporizando atos de violência contra diferentes mulheres.
Desculpa de araque
Começo pelo arrogante pedido de desculpas do ator José de Abreu à deputada Tabata Amaral (PSB-SP), alvo de ameaças físicas compartilhadas pelo agora arrependido artista e militante em tempo integral do PT, que prefere agredir em vez de debater, quando se depara com alguém que diverge de sua opinião.
Foi justamente por discordar da posição declarada por Tabata Amaral, em defesa de uma candidatura alternativa para a disputa presidencial de 2022, que José de Abreu se deixou levar por um “impulso” e retuitou um post dirigido a jovem parlamentar: “Se te encontro na rua, soco até ser preso”.
Assim como o presidente Jair Bolsonaro admitiu ter agido pelo “calor do momento” nas manifestações de 7 de setembro, na qual anunciou sua disposição de descumprir decisões do Supremo Tribunal Federal, José de Abreu tentou justificar o injustificável em artigo publicado pelo jornal “Folha de S.Paulo” na última quarta-feira (29).
“Quem lida com redes sociais sabe que retuíte (RT) não significa endosso de opinião... Só que não! Só que eu não falei explicitamente. O resultado é que o RT criou polêmica enorme, e eu peço desculpas à deputada Tabata Amaral. Errei redondamente ali”, admitiu visivelmente contrariado.
A repercussão negativa do gesto já tinha levado o agora arrependido a apagar o compartilhamento impulsivo, com o qual alega que não concordava de verdade. O pedido de desculpas público, no entanto, só apareceu depois de Tabata ter anunciado que pretendia notificar o ator na Justiça.
Uma suspensão é suficiente?
Assim como o citado pedido desculpas de José de Abreu, uma suspensão de 21 meses também aparece amena demais para o presidente afastado da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Rogério Caboclo, perante o assédio sexual e moral denunciado e comprovado, sofrido pela ex-secretária do dirigente.
Entre as provas apresentadas pela vítima, estão as gravações de conversas em que o chefe pergunta detalhes de sua vida sexual. Em um outro trecho da gravação, Caboclo chama a funcionária de “cadelinha” e ainda lhe oferece biscoito de cachorro.
A punição aprovada por unanimidade pela assembleia geral da CBF vale até março de 2023, um mês antes do término de seu mandato. Ainda que inédita na história da entidade, pode-se dizer que a punição foi branda diante dos traumas provocados na vítima.
Mais chocante ainda é saber que o reverenciado futebol brasileiro voltará a ser representado por alguém com aquele tipo de comportamento, mesmo que só por mais 1 mês? Um desrespeito com todas mulheres brasileiras, ou seja, a maioria da população do país.
De suspeita de estupro em reality a casos de assédio na rua
O que dizer então de uma emissora de TV que assiste impassível um dos participantes de seu reality show se aproveitar de uma colega bêbada, a despeito de seus pedidos para que o assediador parasse?
Só no dia seguinte ao suposto estupro de vulnerável e diante da repercussão que o assunto tomou nas redes sociais é que a emissora de TV decidiu agir e anunciou a expulsão sumária do assediador. O caso agora segue sendo investigado pela polícia de São Paulo.
Se isso ocorre dentro de um reality show com transmissão 24 horas, imaginem quantas cenas passam despercebidas pelas ruas do país. O caso da ciclista Andressa Lustosa, que caiu da bicicleta após um homem em um carro passar a mão no seu corpo, só não passou batido por conta de uma câmera de segurança.
As imagens gravadas pela câmera indiscreta mostram quando um carro se aproxima de Andressa e um homem coloca a mão para fora para tocar na ciclista, que cai no chão. O suspeito foi preso na última terça-feira (28). A polícia descobriu que nada menos do que 4 pessoas estavam no carro no momento do crime.
Só a punição exemplar pode frear esse tipo de violência e alterar tal realidade enfrentada diariamente por tantas mulheres. As mudanças podem ser lentas, mas não desistiremos. Isso é certo!